Da banda formada em 1985
para um único show na faculdade de Arquitetura da UFRGS até os dias de hoje
muito tempo passou e muita coisa aconteceu na vida de Humberto Gessinger, que
em 2015 completa trinta anos de carreira. Multi-instrumentista, compositor,
escritor, 3 milhões de discos vendidos, oito discos de ouro, Gessinger é plural
e dispensa apresentações. Com uma carreira consolidada que começou com os
Engenheiros do Hawaii, passou pelo Pouca Vogal (projeto em parceria com Duca
Leindecker, entre 2008 e 2012) e agora segue solo, o cantor está lançando o DVD
inSULar, que além de músicas consagradas, traz também cinco canções gravadas na
serra gaúcha em um formato bem mais intimista. Gessinger, que está em turnê
pelo Brasil, não esconde a influência do Rio Grande do Sul em sua vida, seja
pela presença frequente nos jogos do Grêmio, seja pela participação no seu
trabalho de artistas consagrados na música gaúcha como Bebeto Alves e Luiz
Carlos Borges.
Você está
completando 30 anos de carreira. Qual a diferença entre fazer música hoje e
fazer música nos anos 80?
Humberto Gessinger: Cada
fase da vida tem suas belezas, não as comparo. Acho que a arte é feita para
romper barreiras de tempo, espaço e estilo. O que importa é a qualidade e a
sinceridade da música. Mas me sinto muito mais à vontade hoje, neste momento e
neste ambiente. Há ferramentas para chegar de forma mais direta em quem se
interessa pelo teu som, sem precisar passar pelos filtros da mídia mainstream.
Queria muito ter estas ferramentas à disposição quando comecei, no fim dos anos
80.
Engenheiros
do Hawaii sempre tiveram um público bastante fiel. Quando surgiu a vontade (ou
a necessidade) de um trabalho solo?
HG: Ao gravar o disco
inSULar, notei que as músicas pediam ambientes diferentes. Convidei vários
músicos que admiro para gravar (inclusive duas formações dos EngHaw). Quando me
dei conta de que não havia uma banda fixa me acompanhando no disco inteiro,
achei mais natural usar meu nome. Mas as composições poderiam estar em qualquer
disco dos EngHaw. E, na estrada, estou com um power trio; então, talvez seja
mais EngHaw do que nunca!
Porque a escolha de Belo
Horizonte para a gravação do dvd inSULar?
HG: Já registrei em DVDs shows no eixo
Rio/São Paulo e na minha terra, POA. Eu devia à BH um registro lá depois de
tantos anos de carinho incondicional.
O dvd inSULar
é uma mescla de um show rock’n roll, gravado em BH, com um set acústico em um
ambiente bem mais intimista gravado na serra gaúcha. Como surgiu a ideia de
“unir” as duas coisas em único dvd? HG: As canções que gravei
na serra gaúcha, um set acústico com alguns dos convidados que participaram do
disco, forma um contraponto entre o som acústico e o pesado. Momentos
diferentes, mas complementares. Um jogando luz sobre o outro.
No final
do ano passado foi lançado o Tributo aos Engenheiros - Espelho Retrovisor - com
a participação de artistas do cenário da música independente, como Fernando
Anitelli e A Banda Mais Bonita da Cidade. Você participou da escolha dos
artistas e das músicas? O que achou do resultado final?
HG: Fiz questão de não me
meter. Este tipo de projeto é mais legal quanto menos reverente for. Me
emocionei muito! Mais do que algum arranjo especial, meu destaque vai para a
diversidade geográfica e estilística das releituras, para o fato de serem todos
artistas que certamente terão uma longa estrada pela frente e o fato da escolha
livre dos caras abranger as 3 décadas de carreira.
E a parceria com o Duca
Leindecker no Pouca Vogal? Pretendem retornar à estrada com o projeto? Teremos Engenheiros do Hawaii de
volta aos palcos? Existe essa possibilidade?
HG: Quanto à volta de PcVgl ou EngHaw, no
momento não passa na minha cabeça. Estou focado no inSULar. Acho o Pouca Vogal
uma plataforma ousada e um ótimo formato para shows, para expressar meu lado de
intérprete e instrumentista mais suave. Mas meu lado compositor é mais selvagem
e incontrolável. Tenho que dar a ele o que ele pede. Às vezes é um power trio,
às vezes é um baita sanfoneiro ou só um violão e uma harmônica. No momento, ele
é que manda e inSULar é o que ele quer.
Como surgiu a parceria com
Esteban Tavares e Rafael Bisogno?
HG: Tavares eu conhecia da Fresno. Rafa, da
cena de música gaúcha. Ambos são músicos muito talentosos e com a vibe certa
para o momento que vivo. Acho legal que eles tenham formações diferentes, um
mais “roquenrrou”, outro mais regional. Nas melhores formações com que toquei
havia esse contraponto. É muito estimulante e abre o leque de possibilidades
para arranjos e sonoridades.
Na tua
opinião o que está acontecendo com o rock nacional? Houve uma perda de
identidade por parte das bandas? Pra onde vai a música
HG: Pra mim o que vale é a
qualidade do som. Independente da tribo. O segredo para permanecer na estrada
depois de tanto tempo é não ir atrás das ondas. Elas são passageiras.
Tu tens cinco livros publicados, o primeiro
em 2008 (Meu Pequeno Gremista) e o mais recente em 2013 (6 Segundos de
Atenção). Em qual momento tu entendeu que tinha coisas a falar que já não
cabiam mais em forma de música e que precisava escrever livros?
HG:A palavra escrita é anterior à palavra cantada na minha
vida. Escrevo desde sempre. Sempre gostei muito de ler e escrever. Por isso a
transição de disco para livro foi natural. Música e literatura são dois galhos
da mesma árvore. A palavra é muito importante pra minha música e o ritmo é
muito importante pro meu texto.
Qual tua principal influência literária?
HG: Nas letras, meus ídolos são mais dispersos, ainda não
consigo enxergar influências muito diretas. Gosto da zona nebulosa entre música
e literatura, não sinto necessidade de colocar cercas neste terreno. Algumas
músicas nasceram de crônicas, o contrário também já ocorreu. Sou um
compositor de textos, um escritor de músicas. Gosto da convergência, da zona
pouco definida em que literatura e música se encontram.